quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Como nosso corpo reage ao estresse?

Doenças de fundo emocional que afetam a pele demandam tratamento com remédios e auxílio psicológico. Auto controle é o melhor paliativo em momento de crise. E a culpa, geralmente, é dele:



Ainda que nem sempre dê para gritar, esbravejar ou descontar a raiva, de uma forma ou de outra, o organismo dá um jeito de colocar as emoções para fora. No caso de pacientes com doenças psicossomáticas (termo usado para definir enfermidades físicas ou não fortemente influenciadas pela mente), o estresse fica, literalmente, estampado. Quando essas irritações se manifestam na forma de doença na pele, o nome muda para psicodermatose. O fim do relacionamento, a perda do emprego ou mesmo aborrecimentos banais podem desencadear crises incontroláveis. 




Segundo um estudo feito em 2003 pelo departamento de psiquiatria da universidade Western, Ontario, no Canadá, mais de 40% das crises e das manifestações cutâneas estão relacionadas a transtornos psiquiátricos. Isso não quer dizer que pacientes com psoríase, vitiligo, dermatite atópica ou dermatite seborreica sejam, por exemplo, depressivos. Mas alguns sintomas podem sim estar presentes na vida dessas pessoas. "De todos os pacientes que se consultam com problemas dermatológicos, 30% a 40% tem alguma dificuldade no seu estar, no seu viver", reforça Luciana Conrado, coordenadora do Departamento de Psicodermatologia da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD). "Não precisa ser depressão, mas há sintomas depressivos e de ansiedade".

De acordo com a médica, o diálogo emoções-epiderme passa pelo sistema endócrino nervoso. "Existe um sistema psiconeuroimunoendocrino que se manifesta na pele e o estresse é um fator importante", explica Conrado. Em outras palavras, a pele reage a hormônios, como a adrenalina e o cortisol, produzidos em maior escala durante situações tensas. O excesso afeta o sistema imunológico e deixa o organismo mais exposto a problema dermatológicos.

Roberto Doglia Azambuja, médico dermatologista e especialista psicodermatose, explica que fatores emocionais atuam em todo o organismo o tempo todo. "Cada emoção corresponde a um estado bioquímico - as emoções são medidas por substâncias químicas produzidas pelo cérebro sob influença dos pensamentos", detalha.



São os pensamentos que facilitam as ações humanas, ou seja: são eles que nos impulsionam a agir, a ter confiança, disposição e a tomar decisões. Contudo, são eles que também podem nos tirar a energia e o ímpeto, criando ansiedade e estresse. Mais do que um fator abstrato, a força da imaginação gera substâncias químicas, que desencadeiam emoções ao serem captadas pelos receptores da superfície das células. "A depender dos pensamentos, as emoções podem ser prazerosas ou não - e elas vão ter efeito sobre os sistemas endócrino e imunológico, prejudicando suas funções". A depressão imunológica  e as alterações endócrinas, segundo o médico, são alguns dos principais mecanismos responsáveis pelo agravamento de doenças.

Marly Marques da Rocha, diretora da Associação Brasileira de Energia e imunopatologia (Asbai), diz que, além dos problemas de pele, algumas alergias pioram ao sinal de estresse. Coceira, vergões na pele (dermografia) e dermatites já instaladas são alguns exemplos. "O paciente alérgico já tem o sistema imunológico muito exacerbado. Neles, os linfócitosT (célula relacionada à alergia) liberam substâncias inflamatórias que desencadeiam a coceira". A sobrecarga emocional, uma noite de sono mal dormida e a própria predisposição individual são alguns dos responsáveis pelo descontrole.

Como se não bastasse os olhares das pessoas, Elias Barros de Magalhães, 54 anos, sofreu com a desinformação até em consultórios médicos. "Alguns me passaram remédios ginecológicos, porque disseram que o que eu tinha era só uma "irritaçãozinha", conta o motorista. Há 15 anos, Elias descobriu ter psoríase, mas só começou o tratamento três anos depois. Nesse intervalo, Elias caiu em várias armadilhas. De garrafadas milagrosas a médicos que o aconselharam isolamento - pois "a família é o cerne de todos os problemas", lhe disseram.

Ter acreditado em tantas promessas não cumpridas não é questão de inocência, garante Elias. "Quase todos os pacientes caem nessas promessas porque você quer se ver livre dessa situação", justifica. As manchas esbranquiçadas custaram o futebol do fim de semana, os banhos de piscinas e as camisetas sem mangas. A cada novo tratamento o motorista via a expectativa se transformar em frustração. Ao mesmo tempo, algumas situações deixavam a vida de Elias mais difícil, como a ocasião em que foi expulso de uma piscina pública, vítima da ignorância dos outros banhistas.



Até mesmo o caso do ex-deputado distrital Rubens César Brunelli Júnior (acima rezando, após receber a propina), acusado de ter desviado, em 2009, R$ 1,7 milhão de recursos públicos destinados a projetos de uma associação comandada por ele, tirou o sono de Elias."Eu sou evangélico como ele e, pode até parecer bobagem, mas esse caso me deixou 100% afetado. Fui até internado", conta. Hoje, Elias encontrou um tratamento sério, melhorou e diz que já se sente "um cara mais tranquilo consigo mesmo".

Gladys Martins, coordenadora do Ambulatório de Psoríase do Hospital Universitário de Brasília (HUB), explica que casos como o de Elias demonstram como as situações angustiantes tem poder de influenciar em muitos aspectos da saúde. "A sequência de eventos imunopatológicos parece ser desencadeada ou agravada por fatores externos, entre eles, o estresse emocional, que agiria como um gatilho".




No controle da situação
A origem desse tipo de problema varia muito. Na infância, a dermatologista Gladys Martins explica que os motivos costumam estar relacionados à perda de um ente querido, à separação dos pais ou à mudança de escola. Na vida adulta, os pacientes reclamam da perda do emprego, de decepções amorosas, da morte de parentes. "A presença de lesões por si só já gera medo de rejeição, insegurança e baixa auto-estima, o que pode alimentar um ciclo vicioso". Para pacientes que apresentam grandes impactos emocionais, além do físico, a médica diz que o ideal é associar o tratamento medicamentoso com o psicológico, uma vez que apenas remédios não conseguem contornar as crises emocionais. Praticar exercícios físicos, ioga ou meditação também são medidas válidas. O importante, segundo Gladys, é controlar os nervos.

Todo o estresse, segundo Roberto Doglia Azambuja, depende da interpretação dos fatos. Não é que os pacientes sejam exagerados, apenas precisam aprender a administrar os acontecimentos da vida - que, por si só, não são nem positivos nem negativos. "O mesmo evento pode gerar estresse em algumas pessoas e alegrias em outras", completa. A recomendação geral, segundo o médico, é cuidar-se sempre, de modo que esteja em condições de equilíbrio o tempo todo. E isso não envolve apenas remédios."Sempre orientamos os pacientes a praticar a postura ereta, a respiração diafragmática, o relaxamento muscular, a meditação, a autoafirmação e visualizações positivas".




Fique atento
Veja alguns sintomas que podem indicar o início de uma crise

  • Dor de cabeça
  • alteração de peso
  • Sono
  • Cansaço
  • Irritabilidade
  • Depressão
  • Raiva
  • Perda de controle emocional
  • Desinteresse no trabalho
  • Diminuição da atividade social
  • Dificuldade de concentração e de tomadas de decisões
  • dúvidas existenciais
Problemas emocionais
Saiba mais sobre as doenças que podem ser influenciadas por fatores emocionais

Psoríase - Doença inflamatória crônica e não contagiosa. As causas ainda são desconhecidas. Caracteriza-se pela presença de manchas vermelhas espessas e descamativas, geralmente no couro cabeludo, nos cotovelos e nos joelhos. Pode se espalhar por toda a pele e pelas articulações.

Vitiligo - Doença adquirida, mas ainda sem causa definida. Caracteriza-se pela ausência de melanina, devido à destruição ou à  inatividades dos melanócitos - células responsáveis pela substância que dá cor à pele). Causas manchas brancas de tamanhos variáveis e em diversos locais do corpo.

Dermatite seborreica - A doença é comum nas três fases da vida e caracteriza-se por caspa, coceira no couro cabeludo, descamação nos supercílios, ouvidos ou nos cantos do nariz. Recém-nascidos podem ter irritação na região das fraldas, mas costuma desaparecer entre os 8 e 12 meses de idade.

Dermatite atópica - Doença crônica que causa inflamação da pele, levando ao aparecimento de lesões e coceira. Afeta geralmente indivíduos com histórico familiar da doença e também de asma ou de rinite alérgica. Essas três enfermidades são conhecidas como as doenças atópicas ou tríade atópica.

Fonte: por Gláucia Chaves/Revista do Correio 

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